terça-feira, 14 de maio de 2013

O Segredo de Joe Gould

"O Segredo de Joe Gould" é o livro vencedor do último Prêmio Nobel da Literatura.
Mitchell percorria as ruas de Nova Iorque à procura de histórias bizarras, sendo um meticuloso observador da realidade (antecipando um outro notável jornalista literário - Truman Capote). A sua escrita é refinada, atenta ao pormenor e repleta de ironia e humor. É uma obra de um só fôlego, imbuída de momentos de supremo gozo literário. O livro "O Segredo de Joe Gould" contém dois perfis que o jornalista escreveu sobre Joe Gould, um vagabundo que largou tudo (inclusive estudos em Harvard) para escrever "Uma história Oral do Nosso Tempo”. Um livro gigantesco, onze vezes maior que a bíblia, onde estaria reunido todo tipo de histórias e conversas que Gould ouvira na vida, recolhendo milhares de diálogos, discussões de rua, bares decadentes de Manhattan, etc. Joe Gould acreditava que, no futuro, essa sua obra seria de grande importância para o estudo histórico de sua época. Tinha como amigos vários escritores, editores, jornalistas e poetas. Morreu em 1957 e o livro que foi escrito nunca foi encontrado. Mas a lenda dizia que existia, aumentando a reputação e a admiração à volta do vagabundo Gould. Em 1964, sete anos após a morte de Gould e mais de vinte anos após o perfil da "The New Yorker", Joseph Mitchell escreveu para a mesma revista outro texto sobre o boémio nova-iorquino - "O Segredo de Joe Gould" -, revelando o mistério guardado por tanto tempo (texto que viria a dar neste livro).
 Depois dessa reportagem histórica, o jornalista nunca mais publicou sequer um texto. Morreu de cancro em 1996.

Cauê Lira

O Segredo de Joe Gould


Joseph Mitchell publicou nas páginas da revista The New Yorker o perfil de um literato maltrapilho que vivia perambulando pelo Greenwich Village, o bairro boêmio de Nova York. O personagem chamava-se Joe Gould. Em 1964, sete anos após a morte de Gould e mais de vinte anos após o perfil da The New Yorker, Joseph Mitchell escreveu para a mesma revista outro texto sobre o boêmio do Village - "O segredo de Joe Gould" -, revelando o mistério guardado por tanto tempo.

Quando o jornalista Joseph Mitchell inicia a narrativa sobre um excêntrico miserável de Nova York dos anos 40, o leitor já se depara com um texto que inspira curiosidade. O personagem em questão é um joão-ninguém, é exatamente isso que instiga também um dos repórteres mais importantes da revista The New Yorker

Seu grande orgulho consistia no maior projeto de sua vida, ao qual chamava Uma história oral do nosso tempo. Nela, o autor relatava sobre pessoas que ia conversando aleatoriamente pela cidade, figuras que, segundo Gould, eram os verdadeiros agentes que moviam a história de um país.

Neste trecho do livro Mitchell descreve Gould:

Gould era um exemplo perfeito do tipo de excêntrico comum em Nova York, o notívago solitário, e era esse traço dele que mais me interessava - esse traço e a História Oral -, não sua boemia; eu havia entrevistado vários boêmios do Greenwich Village e os achara surpreendentemente enfadonhos.

Ele era a criança catarrenta; era o filho que sabe que desapontou o pai; era o tampinha, o nanico, o metro-e-meio, o meio-quilo; era Joe Gould, o poeta; era Joe Gould, o historiador; era Joe Gould, o selvagem dançarino Chippewa; era Joe Gould, a maior autoridade mundial na língua das gaivotas; era o proscrito; era o exemplar perfeito do notívago; era o ratinho; era o único membro do Partido Joe Gould [...]

Gould parecia um vagabundo e vivia como um vagabundo. [...] Era disparatado, arrogante, intrometido, mexeriqueiro, caçoísta, sarcástico e grosseiro.
Gould não é, de forma alguma, um vagabundo. Acredita que a diversão que proporciona vale o que consegue filar. Não bajula ninguém e não agradece. Se o afastam polidamente, dá de ombros e vai embora. No entanto, se alguém faz algum comentário do tipo ‘Fora daqui, vagabundo’, volta-se para o ofensor e, sem se importar com seu tamanho, passa-lhe uma descompostura chula numa voz esganiçada e fanhosa. E não mede as palavras.

Joe Gould é um homenzinho alegre e macilento, conhecido em todas as lanchonetes, tabernas e botecos imundos do Greenwich Village há um quarto de século. Às vezes ele se gaba de ser o último dos boêmios. ‘Os outros caíram fora’, explica. ‘Uns estão na cova, outros no hospício e alguns no ramo publicitário’.



O Segredo de Joe Gould é bem mais que uma reportagem. Não apenas pela qualidade do texto, a capacidade de escutar e a paciência do repórter Joseph Mitchell, mas também pela relação que se estabeleceu entre entrevistador e entrevistado.

Gould morreu em 1957 e o livro que vinha escrevendo, Uma história oral do nosso tempo, nunca foi encontrado - não se sabia, então, nem mesmo se chegara de fato a existir. Depois dessa reportagem histórica, o Mitchell nunca mais publicou sequer um texto. Mesmo assim, continuou a frequentar a redação diariamente e a receber salário até o fim da vida. Morreu de câncer em 1996.

Em 2000 houve uma adaptação para o cinema, dirigido por dirigido por Stanley Tucci e estrelado por Ian Holm, Hope Davis, e o próprio Stanley Tucci, sendo bem aceito pela crítica especializada.





- Rodrigo Fabretti

Anjos da Morte

Ambientado durante a Segunda Guerra Mundial, "Filhos do Éden II: Anjos da Morte" leva o leitor ao universo celestial criado por Eduardo Spohr em "A Batalha do Apocalipse".
Sucessor de "Filhos do Éden : Herdeiros de Atlântida", o romance conta a história de Denyel, um querubim exilado, e sua trajetória com o grupo intitulado Anjos da Morte às margens do apocalipse. A obra é ambientada na linha tênue entre o mundo espiritual e material, onde seres celestes possuem a habilidade de transitar entre ambos. O timeline da história compreende a invasão das tropas aliadas à queda do muro de Berlim em 1989.
Segundo Spohr, o sucessor de Filhos do Éden: Anjos da Morte já está sendo planejado.


Cauê Lira

Livro: O Segredo de Joe Gould

Uma das principais virtudes de Joseph Mitchell, considerado um dos maiores expoentes do Jornalismo Literário, é a fluência dos seus textos. Notório perfeccionista e muito cuidadoso com as palavras, o autor é capaz de dar leveza ao que escreve e proporcionar horas seguidas de leitura de suas obras, sem que isso seja uma tarefa cansativa. O Segredo de Joe Gould é um exemplo típico dessa valiosa característica de Mitchell, um livro do tipo que as pessoas costumam dizer que lêem em uma única “sentada”, apesar preencher 138 páginas.

Mas a fluência textual do escritor não é o único fator que faz com que o livro possa ser lido de uma vez só, a personalidade extremamente instigante do protagonista é tão responsável pela façanha, quanto as habilidades literárias de Mitchell. O perfil irreverente, por vezes cínico e sarcástico, do boêmio de Nova York consegue despertar o interesse do leitor, que se sente mais próximo de Joe Gould a cada página virada. Essa intimidade entre leitor e personagem é fruto do exímio trabalho de apuração do jornalista, que conviveu vários anos com Gould até concluir os dois artigos que compõem o livro.

“O Professor Gaivota”, escrito em 1942, e “O Segredo de Joe Gould”, de 1964, são os dois perfis do boêmio, escritos por Mitchell que juntos dão unidade à obra. Apesar de que a princípio o segundo possa parecer uma reiteração aprofundada do primeiro, aos poucos é possível entender a intenção do autor de juntar os dois artigos em um único volume. Ao término da leitura, depois da revelação do segredo, não resta mais hesitações acerca de como a união dos textos é imprescindível à coesão e à compreensão plena do livro.

Outro êxito da compilação são as pertinentes digressões do autor que revelam partes de sua própria vida e fatos interessantes do processo de elaboração da obra. Alguns trechos metalingüísticos interrompem momentaneamente a descrição das peripécias de Gould e colaboram tanto para a que o texto não se torne cansativo, como para aumentar o interesse do leitor pelo protagonista. Em certos momentos da narrativa, Mitchell parece ser capaz de transferir ao texto suas aflições, sentimentos e reações em relação ao boêmio de vida desregrada.


Perfil de Gould – Na maior parte do livro, Joseph Mitchell se dedica a narrar e descrever a biografia, as idiossincrasias e as irreverências de Joseph Ferdinand Gould, que indubitavelmente representam o ponto alto da obra. Descendente de tradicionais famílias americanas, Joe desiste de se dedicar a um ofício depois que se graduou em Harvard e prefere ser um boêmio de Nova York, que usa roupas poídas, raramente tem mais de um dólar no bolso, vive às custas de favores de amigos e fuma guimbas de cigarro apanhadas no chão das ruas.

No decorrer do texto, o personagem se mostra carente e revela imensa necessidade de chamar atenção. Para isso, não se cansa de enumerar suas qualidades, das quais a que mais gosta de exaltar é a capacidade de entender as gaivotas, já que segundo ele, passou bastante tempo as observando. Nas festas que freqüenta, quase sempre sem ser convidado, Gould não perde a oportunidade de expressar os grunhidos e movimentos típicos que aprendeu na companhia das tais aves.

Apesar de todas as essas excentricidades, o maior atrativo de Joe Gould é o livro que ele escreve desde o princípio de sua boemia, ao qual ele se refere como “A história oral de nosso tempo”. Segundo o protagonista, o livro é o maior já escrito no mundo, compostos de alguns capítulos de ensaios sobre seus devaneios e outros de transcrição de conversas ouvidas por ele, durante suas perambulações nas ruas. Para Gould, o livro representa o seu maior tesouro e o meio pelo qual vai escrever o seu nome na posteridade e ser considerado um grande historiador dos tempos modernos.

Barbara Demerov

O segredo de Joe Gould




O atual cenário do jornalismo convencional, com toda a sua lógica industrial
de leads, pirâmide invertida, pautas etc, nos despertou o interesse em estudar
um modelo do jornalismo pouco discutido entre os estudantes de
comunicação: o Jornalismo Literário. Hoje, o excesso de trabalho e a falta de
tempo não facilitam o processo de construção de textos com características
literárias. Os recursos e espaços nos jornais impressos não permitem que haja
abertura para textos mais longos. Informações fragmentadas são justificativas
de que os leitores não gostam e estão sem tempo para ler, tornando claro o
preconceito que atinge grande parte dos meios de comunicação.
Nesse cenário, a imprensa perde a oportunidade de contar histórias de vidas
que poderiam despertar nos leitores uma identificação que vai além do
simples fato cotidiano. Histórias que poderiam gerar empatia fariam com que
o leitor se identificasse com a experiência do outro. A preocupação com este
jornalismo cada vez mais engessado fez com que escolhêssemos um objeto de
pesquisa que é considerado uma obra-prima do Jornalismo Literário. Sendo
assim, acreditamos que de alguma forma proporcionaremos uma oxigenação
às práticas jornalísticas dos que lêem este trabalho, bem como das prateleiras
que estão cheias de monografias que, muitas vezes, não trazem nada de novo
e que poderiam agregar algum valor à atividade jornalística.
Este trabalho tem como problema de pesquisa a busca da verificação dos
elementos jornalísticos e literários e seus hibridismos na construção dos perfis
de Joe Gould.






a obra de Joseph Mitchell é considerada um dos
clássicos do jornalismo literário. O interesse também surge por ter sido ele
um jornalista que sabia ouvir. Seu jeito ímpar de narrar o mundo também
desperta a curiosidade de estudar seus textos, em especial o perfil de Joe
Gould. A grande representatividade do hibridismo entre jornalismo e
literatura encontrada no livro é um fator que também aguça o interesse em
estudá-lo. Todas essas características nos fazem acreditar que o objeto de
análise poderá contribuir para uma nova visão para além do jornalismo
convencional, criando discussões saudáveis em âmbito acadêmico.
Joseph Mitchell foi um dos jornalistas americanos mais respeitados do século
XX. Destacou-se pela forma minuciosa que utilizava para descrever seus
personagens. Em O Segredo de Joe Gould (2003), ele narra a convivência
com o personagem desde o primeiro encontro. Segundo João Moreira Salles,
no posfácio escrito para o livro.






Devido à grande relevância no cenário do jornalismo e da literatura, nosso
problema de pesquisa é verificar os elementos dos textos jornalístico e
literário e seus hibridismos na construção dos perfis de Joe Gould. Na
metodologia será feita análise de conteúdo com duas modalidades: análise
categorial e análise de discurso.
À princípio, será feita uma categorização que irá abordar aspectos de um
texto jornalístico, as características dessa prática e suas limitações. Serão
analisadas também as divergências e convergências do jornalismo e da
literatura. Para a análise serão retirados trechos do texto para aplicação dos
conceitos teóricos. Também serão abordados aspectos de um texto literário,
como a narração do espaço: paisagens, interiores, objetos, a livre
interpretação etc. A análise do discurso será fundamental visto que serão
feitas observações detalhadas do sujeito no texto.
O objeto empírico a ser analisado é o livro O Segredo de Joe Gould (2003),
de Joseph Mitchell. Ele faz parte da coleção Jornalismo Literário, da
Companhia das Letras e foi publicado em 2003, pela Editora Schwarcz, cujo
título original é Joe Gould’s Secret. A tradução foi feita por Hildegard Feist,
com posfácio de João Moreira Salles.
O livro possui dois perfis de um mesmo personagem, escritos pelo jornalista
Joseph Mitchell para a revista The New Yorker. O primeiro, O Professor
Gaivota, foi escrito em 1942 e publicado na edição de 12 de dezembro do
mesmo ano. O segundo, O Segredo de Joe Gould, saiu nas edições de 19 e 26
de setembro de 1964, 22 anos depois.

Rodrigo Bifani


O Segredo Joe Gould

 O personagem em questão é um joão-ninguém; um “homenzinho” que anda pelos bares e ruas e não tem nada de celebre ou exemplar para mostrar.

Além de ser uma presença atípica nas ruas da metrópole, o andarilho beirava o limite entre uma pessoa única e inocente, mas desagradável ao mesmo tempo. Sua excentricidade rendia-lhe convites, assim como podia causar náuseas como quando ele insistia em mostrar saber falar o idioma das gaivotas: o “gaivotês”. Mas seu grande orgulho consistia no maior projeto de sua vida, ao qual chamava Uma história oral do nosso tempo.

O livro é dividido em duas partes justamente pelo cuidado que Mitchell tomou ao publicar o que rendeu duas reportagens na New Yorker. O primeiro, intitulado O Professor Gaivota, é mais curto e conta sobre essa figura fascinante que também era capaz de irritar o narrador em algumas conversas que pareciam não ir mais a lugar algum. O segundo perfil, este o próprio O Segredo de Joe Gould, foi publicado vinte e dois anos após o primeiro, em 1964, quando Gould já havia morrido. Mitchell continuou uma história que julgara impossível de relatar quando seu personagem ainda vivia ,preservando sua dignidade.

O suspense para descobrir o que Joe Gould escondia de todos só não causa tanta aflição porque a narrativa flui e faz com que o leitor se aproxime e crie uma simpatia tanto pelo boêmio nova-iorquino quanto pelas situações vividas por ele. O segredo revelado finda uma busca seguida pelo repórter a passos de detetive e carregada de voltas em torno dessa personalidade tão ímpar.


Thainá Marques

O segredo de Joe Gould


O Segredo de Joe Gould se caracteriza por ser  bem mais que uma reportagem. Não apenas pela qualidade do texto, a capacidade de escutar e a paciência do repórter Joseph Mitchell, mas também pela relação que se estabeleceu entre entrevistador e entrevistado.


Mitchell se interessou por Joe Gould por duas razões: por este ser um homem solitário e também por ser autor da História Oral, obra à qual Gould dedicou muitos anos de sua vida, percorrendo a cidade de Nova York, ouvindo as pessoas e anotando tudo que lhe parecesse interessante,Gould era um exemplo perfeito do tipo de excêntrico comum em Nova York, o notívago solitário, e era esse traço dele que mais me interessava.

O repórter manteve o segredo de Joe Gould por muitos anos e só o revelou sete anos após a morte de Gould. Um segredo que por muitos momentos ele se arrependeu de ter descoberto e que virou tabu entre ambos: nunca discutiram a fundo a questão, pois Mitchell percebeu que o segredo era a própria vida de Gould.

Não revelaremos o segredo de Joe Gould por amizade ao leitor. No entanto, para aguçar ainda mais a curiosidade pela leitura da obra, acrescentamos que depois que Mitchell revela o segredo de Gould, passa a revelar alguns de seus próprios segredos e a perceber suas próprias e insuspeitas semelhanças com o boêmio, mendigo, excêntrico e interessantíssimo Joe Gould.

Novamente nas palavras de Mitchell: ‘O Excêntrico Autor de um Grande Livro Misterioso e Inédito  essa era sua máscara. Escondido atrás dela, criara um personagem muito mais complexo, a meu ver, do que a maioria dos personagens criados pelos romancistas e dramaturgos de sua época.

A vida e quem sabe até mesmo o jornalismo supera a ficção. No entanto, nunca é demais lembrar que o repórter teve todo o tempo de que necessitou para escrever sua matéria. Eram tempos em que era possível praticar o jornalismo literário, hoje devidamente ultrapassado pelo jornalismo em tempo real. Tempo real no qual um personagem como Joe Gould talvez só pudesse existir na ficção.
                                             Larissa Karoline